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  • Vera Galante

DEMOCRACIA À BRASILEIRA

Dependendo da versão que se escolhe, o Brasil nunca sofreu ruptura em sua democracia. Usando um exemplo bem recente, durante o período de 1964 a 1985 não houve uma ditadura militar porque, afinal, os generais presidentes eram “eleitos” por seus pares. Durante este período o Supremo Tribunal Federal funcionou com relativa liberdade e o parlamento, depois de ser fechado por um período, funcionou com dois partidos, sob o peso do AI-5 – é verdade. Os que se opunham ao regime com mais veemência eram taxados de “subversivos” e o destino era incerto: prisão, tortura e “suicídio”, exílio político ou simples desaparecimento. Entretanto os militares e muitos civis de então e muitos hoje ainda se recusam a chamar o período de ditadura militar, mas não têm problemas em reconhecer o regime militar.

Com a chamada “redemocratização” (espera um pouco: se não houve ruptura na democracia, então porque chamar de redemocratização?) um presidente civil, Tancredo Neves, foi escolhido por um colégio eleitoral e o poder entregue ao seu vice, José Sarney, por impedimento do titular. Mas a posse do presidente Sarney também não foi isenta de controvérsias – os militares não estavam muito satisfeitos, mas acabaram “deixando” que ele tomasse posse. O então general presidente, João Baptista de Figueiredo, saiu pela porta dos fundos se recusando a passar a faixa para o seu sucessor. Mesmo assim Sarney tomou posse. Depois dele, eleições diretas para presidente e Fernando Collor foi eleito.

Desde a redemocratização dois presidentes sofreram impeachment – com gente contra e a favor, como é normal em democracias, mas a transição para os vice-presidentes, que terminaram o mandato do presidente eleito, foi tranquila. Também houve alternância de poder, como se espera em democracias – fomos governados pelo MDB (que depois se tornaria PMDB e agora volta à sua sigla original), PRN (o partido nanico ao qual Collor era filiado), PSDB (Fernando Henrique Cardoso), PT (Lula e Dilma) e PSL (partido pelo qual Jair Bolsonaro, hoje sem partido, foi eleito). Houve oposição apaixonada a todos os presidentes – isso é saudável. A oposição é necessária e desejável. Desde a posse de Sarney nunca houve prisões ou “desaparecimentos” por conta de oposição ao governo – ao contrário, houve anistia aos opositores do “regime” militar e muitos voltaram do exílio para uma vida política ou acadêmica ativa.

Nós nos acostumamos com a democracia e com uma estabilidade econômica recentemente conseguida. O país voltou a prosperar e a ser respeitado pelo mundo. Voltamos a ter orgulho de nossa nação!

A eleição de Jair Bolsonaro em 2018 despertou uma parte da população que nunca admitiu que houve ditadura militar, tortura e outros atos arbitrários de 1964 a 1985. Essa parcela da população apoia cegamente o discurso antidemocrático de Bolsonaro e de muitos militares que o cercam – embora o presidente não tenha passado da retórica, pois precisa de alimentar esta parcela de seu eleitorado para tentar garantir sua reeleição. Além de inicialmente ameaçar o STF de intervenção (descobriu que ser presidente não lhe dá plenos poderes), e outras ameaças vazias, sempre questionou a isenção das urnas eletrônicas.

As urnas eletrônicas são altamente seguras e são auditáveis em qualquer tempo durante as eleições. Elas não são interligadas pela Internet, portanto ataque de hackers é altamente improvável. Mas a bola da vez é a urna eletrônica. Bolsonaro tem repetido para quem quiser ouvir, que se não houver voto “auditável”, ou seja impresso (mesmo que não fique em poder do eleitor), não haverá eleição em 2022. Será que vem uma ruptura democrática por aí?

Difícil. Apesar da retórica autoritária e “golpista”, palavra que ganhou múltiplos sentidos desde o impeachment de Dilma Roussef, há grande oposição a isso. O Presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, aliado do presidente Bolsonaro, já disse que não apoia uma ruptura institucional – ou seja, já colocou limites em sua fidelidade a Bolsonaro. O Senado nunca foi cogitado como aliado do presidente. O Supremo Tribunal Federal também não permitirá uma aventura autoritária. E, apesar da ameaça, o presidente não conta com o apoio total das Forças Armadas. Recentemente o vice-presidente Hamilton Mourão afirmou que “haverá eleições” em 2022.

A imprensa dá voz a essa retórica, que é o que o presidente quer – vale a máxima “falem mal, mas falem de mim”. Toda essa polêmica tira o foco de que as investigações da CPI da pandemia estão cada vez mais próximas do Palácio do Planalto e da família Bolsonaro – seus filhos estariam envolvidos em negócios escusos e a saúde do presidente não vai tão bem assim. Aliás, na hipótese de ele não concorrer à reeleição (cada dia mais plausível), esta será uma boa desculpa.


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