AS CARTAS DE JOBIM
Apesar da crise sistêmica que vamos experimentando, desde a segunda eleição presidencial de Dilma Roussef (2014), solidificam-se interpretações do passado e são feitas projeções para o próximo termo de governo (2019-2022) com iminente carga de realismo. Algo desconhecido das campanhas e disputas politicas, desde o fim da ditadura (1985).
A dura realidade exposta pela crise fiscal, a centralidade assumida pela reforma previdenciária, a necessidade de ajustes e reformas na legislação trabalhista, bem como o enfrentamento da questão que envolve maior ou menor abertura da economia brasileira ao Exterior, parecem ter assumido as posições mais cruciais do tablado político.
Uma dimensão importante do cenário, todavia, tem ficado fora da linha de exercícios de tiro: a dívida pública em si mesma, que compromete porções assustadoras do Orçamento da União. Ela tem sido tratada no bojo da “crise fiscal”, mas, dada sua natureza e resiliente presença na história do Brasil, não tanto pelo seu volume absoluto e relativo em relação ao PIB, pois outros países estão em situação pior (Itália, Japão, USA), mas pelos exíguos e diferenciados prazos de amortização, deveria merecer considerações mais amplas.
Isso porque a existência desta Dívida Pública é uma dimensão estratégica para o atual e para o próximo governo, determinando e constrangendo as margens de investimentos básicos (infraestrutura, modernização das Forças Armadas) e custeios fundamentais em políticas públicas essenciais (educação, saúde, segurança) – hoje disciplinadas pela Lei do Teto, o que tem levado o país a uma recessão desconhecida e não-desejada, com a maior gravidade em sua história.
Entre as questões de ordem estrutural, estão o emergente fenômeno do narcotráfico - comprometendo crescentes massas de servidores pobres e expelidos ou impedidos de chegar ao mercado de trabalho formal no país, em flagrante clima de desânimo e anomia generalizados. Algo precisa ser feito, relacionando os dois fatores determinantes do fenômeno avassalador: a)- a cultura da droga como scapegoat ; b)- o narco como mercado econômico em grande crescimento.
Relacionado a isso, está a questão educacional, envolvendo todos os níveis de escolaridade, do elementar à graduação. O abandono relativo da presença direta do Estado (cerca de 76 % das matrículas do ensino superior estão no setor privado) e a desqualificação notável do próprio ensino, diante de cenários comparativos internacionais, são indicadores a serem considerados como também “estratégicos.
Por estas e outras questões, o cenário de depressão econômica e desorganização social causada pelo alto desemprego e quebra das expectativas, de empresários à população em geral, tem tensionado a sociedade brasileira de modo desconhecido. Pesquisas recentes apontam para 72% da juventude desejando “estar fora do Brasil”. As pesquisas eleitorais para a presidência da república apontam a maioria dos eleitores preferindo não votar ou anular o voto; além da alta rejeição a todos os pré-candidatos. São exemplos, ilustrando o ambiente de desconfiança nas instituições e no futuro da sociedade brasileira.
Ou seja, para enfrentar o quadro estrutural, composto pelos problemas e dilemas mais permanentes do processo histórico brasileiro, além da capacidade gestão, é necessário – desta vez e impreterivelmente – recompor o ambiente de convivência, tolerância entre contrários e busca de soluções que acarretem melhorias sensíveis e mínimas perdas possíveis.
Neste quadro, partidos e pré-candidatos à presidência da república necessita reconstruir as possibilidades de apoio por parte do eleitorado, bem como indicar capacidade gestão e de construção de alianças estratégicas.
Nelson Jobim, contando com larga experiência ministerial nos últimos governos, com ampla margem de circulação entre elites empresariais e partidárias – de FHC a Lula e seus respectivos partidos e grupos de apoio- apresenta-se como um clássico e raro membro da elite governante, não necessariamente reinante. Imprescindível recurso estratégico do sistema político nacional, inquestionavelmente.
Assim são as cartas de Jobim. Merecem ser consideradas nas próximas composições de forças, que deverão, sim, reinar no Brasil. O epílogo talvez seja, meramente, um detalhe!