Dança de Cadeiras dos Nossos Vizinhos ao Norte.
Donald J. Trump, o magnata do ramo imobiliário e apresentador do programa The Apprentice foi eleito para governar os Estados Unidos da América – pelo menos foi o mandato que os eleitores lhe confiaram. Só que ele montou sua equipe como se fosse The Celebrity Apprentice e convidou várias estrelas do setor privado para trabalharem com ele no governo, dentre elas o ex Secretário de Estado Rex Tillerson, na época CEO da ExxonMobil pelos últimos 11 anos. Um homem de muito sucesso, que dirigia a maior empresa de petróleo do mundo. Tarimbado negociador e conhecedor, como poucos, do setor de energia – especialmente o de óleo e gás. Talvez fosse um excelente Secretário de Energia ou de Comércio, mas foi chamado para ser Secretário de Estado. Escapa-nos a lógica do convite para ser o Diplomata Chefe dos EUA – talvez porque, por força do cargo, viajasse o mundo para vender seu produto, talvez por conhecer vários chefes de estado – dentre eles Vladimir Putin... Impossível saber o que se passava na cabeça do presidente-eleito Donald Trump.
Tillerson foi recebido no Departamento de Estado com otimismo, especialmente se comparado aos outros possíveis ocupantes do cargo. Contudo, desde cedo ficou evidente sua falta de prestígio junto ao Presidente, um homem centralizador, nacionalista, protecionista com arroubos de onisciência e onipotência. Tillerson não era consultado para quase nada e, quando era, seu conselho não era ouvido. Em algumas ocasiões levou pito do chefe pelo Twitter e muitas vezes sabia por outras fontes que quem representaria os EUA em eventos internacionais onde iam Presidentes ou Chanceleres, seria alguém da família Trump e não ele. O desprestígio do Departamento de Estado era tão grande que em recente visita ao México, Jared Kuschner, genro do Presidente e seu assessor especial (cujo acesso a documentos secretos do governo foi suspenso por aparentes conflitos de interesse) visitou o Presidente Enrique Peña Neto sozinho e a Embaixadora Roberta Jacobson (demissionária) sequer foi comunicada da visita e muito menos convidada para a reunião. Também não sabia, embora desconfiasse, do assunto tratado. A visita veio na esteira de um telefonema ácido entre Peña Neto e Trump que provocou o cancelamento pela segunda vez de uma visita presidencial aos EUA.
Durante seu período à frente do Departamento de Estado, Tillerson viu vários Embaixadores se demitirem e vários altos assessores também deixarem os seus postos. A baixa mais sentida talvez tenha sido a de Thomas Shannon, que era o Subsecretário de Estado para Assuntos Políticos. Shannon é um profundo conhecedor da América Latina (são muito poucos no Departamento de Estado) e habilíssimo negociador. É considerado um moderado procurando sempre o diálogo ao enfrentamento. Essa sua atitude não era de agrado do Presidente, que várias vezes externou sua insatisfação com o que ele chamava de brandura do sub-secretário. Shannon esteve envolvido em todas as grandes negociações recentes da história americana – Cuba, Venezuela (sim, ele é talvez um dos únicos americanos a ser recebido por Maduro), Haiti, Coréia do Norte, Turquia... e muitas outras que não foram divulgadas. Shannon também pediu aposentadoria por motivos pessoais. Oficialmente a única pessoa que sai por discordar frontalmente de Trump é o ex Embaixador John Feeley, do Panamá.
Tillerson nunca se adaptou ao cargo, mas mostrou alguma moderação em momentos importantes – acordo com o Irã, Acordo de Paris, diálogo com a Coreia do Norte, e tantos outros. Ele também censurou veementemente a Rússia no recente episódio do envenenamento do ex-agente russo e sua filha na Inglaterra e estava voltando da África, para onde foi tentar apagar o fogo que seu chefe tinha desastradamente acendido. Ouviu o You’re Fired” pelo Twitter depois de um longo período de desgaste.
Sai Tillerson, entra Mike Pompeo, e quem é ele? Pompeo foi deputado pelo estado do Kansas por três legislaturas, mas o mais importante é notar que frequentou a academia militar de West Point (onde Trump gostaria de ter estudado) e serviu nas forças armadas por 5 anos. Qualquer experiência militar agrada ao Presidente. Pompeo, um conservador duro como Trump, ganhou logo a simpatia do presidente, que o convidou para ser Diretor da CIA e, com a queda de Tillerson, o nomeou Secretário de Estado.
O recado para o mundo não é muito animador. Pompeo foi escolhido porque “como Diretor da CIA, Mike recebeu elogios de ambos os partidos por fortalecer nossa coleta de inteligência, modernizar nossa capacidade defensiva e ofensiva, e construir laços estreitos com nossos amigos e aliados na comunidade internacional de inteligência. Ele continuará nosso programa de restaurar o status da América no mundo, fortalecer nossas alianças e confrontar nossos adversários, além de perseguir a desnuclearização da Península Coreana”, diz o comunicado da Casa Branca. Não há qualquer referência à habilidade ou à experiência em negociações internacionais, ou a qualquer outra qualidade que tem um diplomata – mesmo porque para Trump isso não é necessário.
Mais importante do que o comunicado, foi o que Trump falou em várias entrevistas – os pensamentos de Pompeo estão aliados com os de Trump, pensam igual. Há dois perigos aí – o comércio exterior e a diplomacia andam juntos – os diplomatas são obrigados a defender as políticas traçadas pelo governo, desde que não firam a constituição. Ou seja, veremos em todos os países certo endurecimento nas negociações comerciais, especialmente do aço, recém imposta pela Casa Branca. A tarifa sobre o aço importado foi uma decisão pessoal do Presidente contrariando até os industriais do aço de seu país. Não importa – ele fez o que ele quis porque quis e Pompeu apoia. É apoio que Trump busca.
Na época da Guerra Fria quando os espiões russos e americanos abundavam, eles normalmente eram infiltrados nas embaixadas como “diplomatas”. Já fazem décadas que não é mais assim, e o governo dos EUA chegou a mudar nomes de agências para não haver qualquer tipo de confusão. Todavia a desconfiança nunca foi embora. E agora com um ex Diretor da CIA como Secretário de Estado, qual a mensagem que passa para o mundo? Só o tempo dirá. Pompeo não deve ter dificuldades em ser aprovado pela sabatina no Senado, que ainda não foi marcada. Ele deve ser confirmado, mas não sem ter que tranquilizar os senadores da Comissão de Relações Exteriores que não vai levar a CIA ou suas táticas junto com ele para o Departamento de Estado. A Comissão é composta por 11 senadores do Partido Republicano e 10 do Partido Democrata. Mas nem todos os Republicanos são totalmente alinhados com o Pres. Trump. O Senador Jeff Flake, por exemplo, fez alguns discursos contundentes contra o Presidente Trump. Mesmo assim, deve ser aprovado e o mundo espera roendo as unhas!
Trump disse em entrevista que ele está próximo de ter a equipe que ele quer – em completa sintonia com ele. Podemos esperar mais algumas trocas em breve para fortalecê-lo na busca pela reeleição.
Várias celebrities já caíram, justamente por serem pessoas que não aceitavam cegamente as ordens do comandante-em-chefe. No final só haverá uma celebridade: Donald Trump.